sexta-feira, 20 de julho de 2018















                                                       O vei Leôncio gostava de samba, mas gostava mais de uma pinga. Bebia o ano inteiro, todos os dias, o dia todo. Pouco, em tempo de menino, o vi são. Mesmo em casa guardava sua cachacinha, escondido da vovó também chegada a uma branquinha. Ela também escondia sua garrafa e era uma briga danada quando um descobria a garrafa do outro e bebia dela para economizar a sua. Não dizem que a cachaça mata, pois a veia morreu com 98 anos o  vei com 108. Talvez a veia tenha morrido primeiro porque tivesse o costume de mascar fumo, o veio não mascava, só fumava. Quanto sonho com a Ponta Coroa, o Malacacheta, eu nunca soube mesmo como era o nome da fazenda do vovô Leôncio. Era tanto malacacheta pelo chão que se a gente não tivesse cuidado escorregava a caía. Os animais sempre escorregavam, parece que tinham um coisa que os segurava. Nunca soube de ter algum animal caído naquelas estradas pavimentadas, naturalmente de mica. Quando batia o sol, chega encandeava a gente. Tinha-se de andar com cuidado. O povo do Malacacheta, o povo do Canto sabia andar por ali, mas qualquer de fora tinha que andar com muito coidado, senão era queda certa. Tio Pichane contara que um dia veio da Capela um pobre coitado trazer uma encomenda, e, como tinha pressa, andava quase correndo, pois o pobre coitado não tomara mais de dez quadas? Numa delas ficou com uma dor e um inchaço que durou muitos dias para curar. Foi muito pano quente, muita água de sal, muita compressa de mastruz e tudo que lhe diziam servir para o inchaço. Menino me perguntava para que serviam tanto malacacheta. Ninguém sabia dizer ao certo. Somente Dequinho de tio Pichane sabia alguma coisa sobre a mica. Saíra do Canto cedo e fora para o garimpo, curioso, comprou livros aprendeu a ler e estudou muito sobre minérios.  A mica é uma riqueza, serve pra muita coisa, mas ninguém vem explorar. Uma pena. Tanta mica, branca, preta, marrom, roxa e verde. Se viessem explorar todos poderiam estar ricos, ou bem de vida. Lamentava-se. Os cangaceiros gostavam muito, vinham de toda parte buscar malacacheta para enfeitar suas roupas e chapéus. Ali ninguém se escondia deles. Todos eram amigos, quando vinham traziam muita novidade que davam a todo mundo, sem que lhes pedissem. Eram terços, xales, espelhos, caixinhas de pó de arroz, perfumes, tudo traziam e distribuíam com todos. Nós, eu digo os meus, lhe davam galinhas, porcos, e caças diversas, as mulheres lavavam suas roupas. Era uma festa quando eles apareciam.  Não eramos coiteiros, mas não os denunciávamos à volante, muito mais feroz que eles. Parece que sempre foi assim, hoje está até pior. Não há nesta terra quem não tenha pago alguma coisa, mesmo sem dever a um policial. Como os juízes, nem feira fazem é só mandar levar em casa. Eles não querem nem ter o trabalho de carregar a feira. Alegam estarem em serviço e o pobre do feirante é que tem de se virar para mandar a feira do soldado. Será que não há como acabar com isto?  

domingo, 1 de julho de 2018











                                   

                         
                             
                                                  Estava sentada na pedra, quebrando licuri. As galinhas esticavam o pescoço para roubar o bago, mesmo antes de quebrar. Impacientes. Tinha de ter cuidado para não bater a pedra na cabeça delas. Patos também faziam isto, contudo, ainda eram mais pacientes. Os porcos ficavam de longe, quebravam o licuri com os dentes, não precisavam de ajuda. Não sei porque ainda não inventaram u´a máquina para quebrar licuri. Tão importante, e ainda não fizeram isto. É preciso uma eternidade para quebrar um quilo de licuri, e vender inteiro é muito barato. Os armazéns preferem-nos quebrados. Fazer sabão, óleo de coco e outras coisas. Levam para Juazeiro e Petrolina para a fábrica dos Coelho. Muito rico, o alicuri. ´Tanta coisa se faz com ele e nem assim tem valor. Cozido, então, como é gostoso. Cozinha-se quase verde, de vez. Para se comer com café. Desde cedo aprendi a lutar com licuri. A gente tamém come seu palmito. Não é muito gostoso, mas dá pra comer. Comida de pobre, dizem. Gosto mesmo é do cozido. Também gosto da paçoca. Pisa o licuri no pilão com açúcar ou rapadura e farinha. Também para comer com café.
                                      Estava assim sentada na paz da tarde. Aqui, acolá, grito de passarinhos. O tamborilar do pica-pau, a fogo-pagô, o misterioso peixe-frito ou matintaperê quando ouvi um tropel de cavalos ainda longe. Iti malia, lá vem coisa.